30 de junho de 2009

Era Glacial Decadente


Não foi minha culpa. Restou-me acreditar que o aquecimento global derrete amores gélidos. Foi culpa do egoísmo, que torna perecível qualquer bilateral afetividade, a fim de trocar o carinho, a verdade e a entrega de si por qualquer outra pessoa ou qualquer coisa outra que não lembre nada mais nosso.

Uma geleira completa nascida num só órgão e que contaminou todo o organismo; menos mal que não seja transmissível.

Nesta frieza, senti-me apedrejado pelo tempo, senhor da razão. Razão que eu nunca quis. Senti uma outra overdose, mas dessa vez diferente: overdose de indiferença.
Brrrruuuu!

Novas palavras que não justificam silêncios contínuos. Obrigações retardadas do relógio que corre, marcando tardiamente a hora de partir para o abismo, a paulicéia cavada no desespero de encontrar qualquer saída ou uma entrada, portal do sol, a liquifazer meu intuito e teu orgulho e medo.

Assim, congelou aquele sonho, aquelas mensagens, aquelas sutis promessas e o diploma da nossa gradativa vontade de bem-querer e acalentar.

Não há mais espaço para votos de sucesso, para retrocesso de transpiração, para qualquer decolagem à procura de centelha de sentimento. Haverá um voo apenas e não-só, para dizer adeus e me sentir bem-vindo, suprimindo a parte que te coubera no meu mais lindo
iceberg.


Imagem: capturada de http://www.mochilaosemfronteiras.com/?p=145

18 de junho de 2009

Sururu à Gilmar Mendes

Quarenta anos após ser criado, o diploma de jornalista não é mais obrigatório no Brasil. O que, na prática, já vinha sendo exercido em muitas redações deste imenso país. Com a decisão do Supremo Tribunal Federal as empresas de comunicação podem contratar profissionais de qualquer outra área (e até mesmo sem formação alguma) para o exercício do jornalismo, sob os olhos cegos da justiça.

Engraçado mesmo foi o argumento do ministro-relator Gilmar Mendes ao equiparar profissões, quando disse que “um excelente chefe de cozinha poderá ser formado em uma faculdade de culinária, o que não legitima o estado a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de curso superior nesta área”.

Então, ofereço-lhe um prato saborosíssimo das terras alagoanas.


Abaixo, a receita:

Ingredientes

1 kg de sururu;
1 cebola média ralada;
1 vidro pequeno de leite coco;
3 colheres de azeite de oliva;
2 tabletes de caldo para peixe;
2 colheres molho de tomate;
cheiro verde a vontade;
1 pimenta de cheiro;
1 pimentão picado;
pimenta do reino branca e sal para corrigir.



Modo de Preparo
  1. Lave bem o sururu , refogue a cebola no azeite, junte a carne do sururu;
  2. Coloque a pimenta do reino branca, o molho de tomate e os tabletes de caldo, e mexa bem;
  3. Deixe cozinhar por mais ou menos 10 min; a carne solta água, deixe reduzir e coloque o leite de coco;
  4. Mexa bem;
  5. Junte o cheiro verde, pimenta de cheiro, pimentão e deixe ferver um pouco; tampe e desligue o fogo;
  6. Sirva com arroz branco.

Em 25min o prato está pronto e serve 3 porções

Bom apetite!


Imagem: capturada de http://www.cdculinaria.com.br/5.htm

17 de junho de 2009

Meu Sangue Latin[d]o


Lágrimas borravam nanquim e sonhos
No papel branco, em branco, dos contraste da vida.
As linhas pretas, a visão turva, a agonia
De quem não prosseguia escrita alguma.
Tudo permanecia borrão.

Eu já não era um homem de palavras.
Elas eram de homem só.
Elas não faziam diferença e companhia.

Tentei escrever com azeviche: não flui.
Troquei por grafite, mas lhe havia na mistura.
E crise de celulose, o meio-ambiente reprime...

Escrevo na pele e no corpo os contraste da vida:
Letras de sangue sobre o moreno-claro da tez
Talvez, eu não conclua nenhuma estrofe.
Certeza, as artérias lhe digam melhor.



Ouça: Sangue Latino, de Secos & Molhados

15 de junho de 2009

Minha Última Amigdalite

Sigo...
Esperando a pronúncia de vocativo em suspiro.
Pronuncio em teclas frias o meu calor.
Leio tórridos vapores nos mínimos graus.
Vez ou outra, afônico...
Resfria-me, do teu estômago,
O teu silêncio.



Imagem: capturada do site Energia Eficiente

14 de junho de 2009

Hoje Amanheci Meio Recifense

Tão cedo de domingo, logo acordei desatento,
Sem previsão de chuva, sem previsão do tempo.
Levantei-me rebocado de preguiça
Dessa que não há sol a pino nem vento
Nem intento que eficazmente atiça.
Relutei o contratempo de minha formosa medida
A ler a última notícia de meu suficiente contentamento.

Tão breve a alegria de tão cedo domingo
Foi acrescida de um efêmero diálogo
Entre duas naturalidades vizinhas
Que delimita o imaginário e limita minha alegria.
Não se compara a outro, que falta
E pouco diz, como céu claro, se me completaria.

Dei-me às lembranças de rios
E ilhas poluídas entre vias cortantes
Dei-me ao luxo dos errantes
De imaginar o que de ideal não bastaria.
Transporte-me, sonho, às pontes cabíveis
A conectar cidades e convergir amantes.

Dei-me ao luxo dos leitores
De viajar de súbito a lugar paisano,
Onde minha guerra não exista,
Onde sua justiça seja calor humano
Que não me faça lembrar o horror
Das trincheiras internas com hora marcada
Da noite que chega, a dormir, alagoano.


Ouça: Frevo Nº2 do Recife


Foto: Olinda (Recife ao fundo), por Angelo Vagni

O Outro Recife

"Casas de lama negra
há plantadas por essas ilhas
(na enchente da maré
elas navegam como ilhas);
casas de lama negra
daquela cidade anfíbia
que existe por debaixo
do Recife contado em Guias.
Nela deságua a gente
(como no mar deságuam rios)
que de longe desceu
em minha companhia;
nela deságua a gente
de existência imprecisa,
no seu chão de lama
entre água e terra indecisa. "



Texto: trecho do poema "O Rio" de João Cabral de Melo Neto
Foto: Rio Capibaribe e os bairros de Madalena e Graças (Cidade de Recife)

12 de junho de 2009

Dia Comum


Eu diria que hoje é um dia incomum, se eu não visse tantos corações artificiais pulsando em vitrinas famintas por consumidores.

Eu diria que hoje é um dia incomum, se eu não passasse por essas vitrinas e não observasse o da celebração de tanto plástico.

Eu diria que hoje é um dia incomum, se eu não prestasse atenção nessa fortuna em movimento, alimento de cofres, equiparando amores.

Eu diria que hoje é um dia incomum, se eu não visse apenas uma data no calendário de dias comuns.

Eu jamais esperaria apenas um dia certo para dizer 'eu te amo'. Então, Jorge Luis Borges, sairia de minha boca se você viesse qualquer dia...

"É o amor. Terei de me esconder ou fugir. Crescem as paredes de seu cárcere, como em um sonho atroz.

A bela máscara mudou, mas como sempre é a única.

De que me servirão meus talismãs: o exercício das letras, a vaga erudição, o aprendizado das palavras que usou o vago norte para cantar seus mares e suas espadas, a serena amizade, as galerias da biblioteca, as coisas comuns, os hábitos, o jovem amor de minha mãe, a sombra militar de meus mortos, a noite intemporal, o gosto dos sonhos?

Estar ou não contigo é a medida do meu tempo. O cântaro já se quebra sobre a fonte, já se levanta o homem à voz da ave, já escureceram os que olham pelas janelas, mas a sombra não trouxe a paz.

É, eu sei, é o amor: a ansiedade e o alívio de ouvir tua voz, a espera e a memória, o horror de viver o sucessivo. é o amor com suas mitologias, com suas pequenas magias inúteis.

Há uma esquina pela qual não me atrevo a passar. agora os exércitos me cercam, as hordas. (este quarto é irreal; ela não o viu.)

O nome de uma mulher me delata.
doí-me uma mulher por todo o corpo. "



Poema Incidental: O Ameaçado de Jorge Luis Borges
Imagem: capturada de http://inoutyou.blogs.sapo.pt/101863.html

11 de junho de 2009

Dias de Orgulho - O que a visibilidade LGBT paulistana verticaliza?

Junho é o 13º Mês do Orgulho LGBT de São Paulo; um conjunto de ações sociais, políticas e culturais realizado pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo - APOGLBT SP – nessa cidade. Com um histórico de resultados quantitativos e qualitativos, essa entidade civil de direito privado busca visibilidade das questões que envolvem a comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros face as suas demandas dentro da sociedade em geral. Sua trajetória coincide com a das Paradas do Orgulho LGBT em São Paulo, pois, foi fundada em 1999 por um grupo de militantes que, desde 1997, vem atuando e promovendo a cidadania e a auto-estima de seu público-alvo, através da realização e incentivo a atividades.

No próximo dia 14 de junho será realizada a apoteótica celebração do evento, a edição chamada 13ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo: manifestação que faz o trajeto pela Avenida Paulista e a Rua da Consolação, com muitas cores, trios elétricos, corpos seminus e publicidade da iniciativa privada e pública, na maior cidade do país.

A programação do evento, que inclui a realização deste dia D, é conectar a sociedade à ideia de luta e reconhecimento pelos direitos humanos de uma fatia da população ainda muito setorizada às margens da democracia. No entanto, grande parte dos participantes dessa marcha, tristemente, vê, diante de todas as ações da APOGLBT SP, apenas a possibilidade de comungar com imenso carnaval fora de época que será, a olhos vistos, o décimo quarto dia deste mês.

Assim, São Paulo é tomada por gente de todos os lugares do País (e até do mundo) a fim de socializar-se com a grande festa - cada vez maior-, alcançando recordes e aquecendo consideravelmente a economia da cidade em apenas um final de semana. Por conseqüência, recursos públicos e privados são injetados no bolo celebrante, como pretexto de apoiar o segmento, tentando encobrir a escassez de políticas públicas mais audaciosas durante os demais meses. O frenesi de um dia ainda não garantiu celeridade nas propostas de direitos tão batalhados pelo setor, como, por exemplo, a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Talvez, se metade dos participantes da Parada voltassem ao lugar de origem, levando consigo a temática do movimento, houvesse uma verticalização de ideias, de fato, vindo a fortalecer a peleja por mais direitos aos LGBT.

Se o intuito, ao menos, fosse o de celebrar o orgulho da sexualidade, muito se ganharia, ainda assim, ao agregar valores e vozes ao movimento. Entretanto, caravanas saem das demais regiões do País para diversão tão-somente, que resulta em comportamento que pouco remete ao engajamento pela causa para que, então, alcance-se o esperado significado do Mês do Orgulho.

A sorte do evento é contar ainda com dimensão que se consegue, mesmo que a quantidade se sobreponha à qualidade ideológica de seus participantes, porém é lamentável ver a transmissão de notícias limitando os trabalhos à pequenez de um carnaval com todas as cores do arco-íris.

Ah, a propósito, o tema deste ano é “Sem Homofobia, Mais Cidadania – Pela Isonomia dos Direitos!”. É tão bom pensar.

Imagem: UOL

9 de junho de 2009

A tola e triste história de Pixiu


Pixiu era um panda que vivia numa região montanhosa e fria. Perdido de seu bando, que foi dizimado por alguns terríveis caçadores, ele passou a viver solitário durante alguns anos, já que era o único sobrevivente naquela área.

Passava o dia só, embora alguns cães aparecessem em seu território, mas sua timidez não lhe dava ímpeto de se unir à matilha. Os uivos e latidos não agradavam ao panda, que sempre preferia se afastar.

Pixiu se alimentava de bambus, alguns insetos e bebia neve derretida, de vez em quando ia aos riachos matar a sede e brincar com as pedras, suas companheiras deste novo caminho. Sua atividade diária se resumia, ultimamente, em comer e brincar.

O solitário panda adorava o pôr e o nascer do sol, eram os momentos do dia em que ele atirava suas amigas pedras no riacho quase congelado do território. O resto do dia, Pixiu dormia nos bosques de bambuzais. Há anos essa erma rotina se repetia.

Não cabia mais a Pixiu acreditar que aquele frio de dentro e de fora fosse mudar. Já fazia muito tempo em que nada, além dos cães que o importunavam mais do que traziam alegria, fazia muito sentido de diferença naquela vida ursina.

Nero, um caçador de uma grande cidade mais ao norte da região de Pixiu, o avistou, num dia corriqueiro, como todos. Pixiu temeu sua aproximação, logicamente, porque havia visto tantos ursos dizimados por causa de seus maiores predadores.

No entanto, Nero percebeu algo diferente em Pixiu. Com seu jeito de urso bonachão, fez o temível caçador olhasse a caça com outros olhos. O que era para ser o divisor de águas nessa relação já ordenada desde muito tempo... Passaram-se alguns meses e o contato estava cada vez mais próximo. Pixiu já dava pulos de felicidade ao sentir, ainda que de longe, a presença de Nero. As pedras no caminho já não eram tão interessantes para serem atiradas no riacho.

Nero sempre andava com suas armas de caça, embora Pixiu nunca tivesse as visto. O caçador havia esquecido de desarmar-se.

Até que um dia Pixiu percebeu que Nero escondia alguma coisa. A fúria do urso foi tamanha, pela ameaça que acabava de perceber, que atacou o caçador com suas garras a ponto de feri-lo sem piedade. O caçador fugiu da região montanhosa e Pixiu perdia um grande companheiro.

Os brotos de bambu já não tem o mesmo sabor.



*Apesar de pertencer à ordem dos carnívoros, o urso-panda se diferencia dos outros da família dos ursídeos, por sua dieta ser quase plenamente à base de brotos de bambu. O próprio nome Panda faz alusão ao 'que come bambu'. Um animal dócil e tímido, dificilmente ataca o homem, desde que não seja ameaçado, portanto é um dos animais mais queridos do mundo.

*Não se tem uma definição exata sobre caçador.


Imagem: capturada do Baixaqui

6 de junho de 2009

Abre e fecha



Mínimo e hipnótico ritmo de vida, repita sempre esta abertura para um percurso de silêncios irresponsáveis que me criticam aborrecidamente.
Quando do desfecho desta via estática, repise só uma vez mais esta melodia.
Eu agradeço!

Créditos do vídeo
Música: Opening (Glasswork) de Philip Glass
Interpretação: Piano por Branka Parlić

5 de junho de 2009

Há um bom tempo já não sou criança


"O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.

O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.

Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença, se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.

Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto."


Texto: Martha Medeiros

3 de junho de 2009

Pintura Híbrida

Chega um momento em que, no meio do negrume, surgem cores inimagináveis.
Então imaginamos o quanto há nuanças diferentes de todos os matizes.
E como um caminho que se abre e invade a escuridão,
Cada passo dado é um frasco de tinta derramado na imaginação.

Foto: divulgação