31 de março de 2010

O grande irmão não é nossa cara?

O Brasil parou, numa terça-feira santa, na semana de nossos mais medíocres pudores, diante de milhões de televisores e um só canal dominante. Nesses 59 anos de história da TV no país, nove entre dez casas possuem um aparelho televisor. Há, nesta nação, uma grande audiência, uma grande ambição corporativa, uma grande mídia e um pequeno avanço sócio-cultural: todos de olho no Big Brother Brasil.
A competente equipe da TV Globo caprichou no desfecho de seu maior sucesso de audiência, em sua ousadia trimestral de 2010. Houve grandes patrocínios, grande atração musical - cantora de muito sucesso popular(esco) - e nós, os receptores de suas ideias comerciais. No entanto, há muito foi quebrado o paradigma da relação emissor-receptor, porque hoje o conceito de interatividade, com ajuda da chamada telefônica, do Serviço de Mensagens Curtas (SMS) e a internet, possibilita que façamos parte das ínfimas decisões nos programas de TV. Eles, atualmente, refletem nossos anseios, fala por nós, fala de nós; falamos para ele, ainda que não se ouça a voz da minoria, no caso de algumas queixas nossas que não podem ser escutadas pelo Brasil. O microfone ainda está na mão do apresentador, que media nossa vontade.
Na noite dessa terça-feira, através do mais famoso reality show do país, quiçá do mundo - já que a Endemol, empresa holandesa, é dona dos direitos do programa e os vende pelo mundo afora -, escolhemos a nossa mais curiosa cara e nosso 'cara', a quem se pode chamar de herói (mesmo?), porque este é o adjetivo que o cerimonioso Pedro Bial dá à cada fantoche do tendencioso entretenimento em formato televisivo.
O Brasil escolheu a ignorância, a brutalidade, o grotesco, a falta de educação e respeito, que reflete o que é sua gente; o que, infelizmente, somos nós.

Foto: globo.com

29 de março de 2010

Cultura de Massa para pensante


Em época de Big Brother Brasil, difícil ver e ouvir outra coisa na imprensa, nas redes sociais ou em canais de comunicação, em geral, mais do que o programa, exibido no Brasil pela TV Globo.
Diferentemente de outros milhões de brasileiros, não sou adepto da programação de entretenimento na televisão aberta, muito menos de programas do tipo reality show. Sinceramente, não vejo colaboração positiva alguma à formação cultural do indivíduo, tampouco diversão com qualidade, em programa que expõe a 'vida' dos participantes e nos convida a bisbilhotar. No entanto, confesso que, na tentativa de acompanhar o sucesso popular, quando oportuno, leio alguns texto na internet sobre esta recente edição, devido às polêmicas sobre questões de gênero e, muito pior, sobre os argumentos homofóbicos de determinado participante, que vem causando bas-fond.
Considero, particularmente, apenas uma infelicidade por parte do jogador Marcelo Dourado compartilhar determinadas observações a respeito do comportamento de gays; considero posição ignorante, muito mais do que uma atitude homofóbica por parte dele.
Em virtude do frisson entre os militantes da causa gay, comecei a assistir ao BBB10, em sua reta final, a fim de que eu pudesse ter opinião crítica de telespectador. Penso que há, sim, um preconceito embutido na mente do tal participante, mas que, de forma insipiente, seus comentários avessos aos LGBTTs são passíveis de indiferença por parte de ativistas favoráveis à diversidade sexual. Os ataques de Marcelo Dourado ao participante Dicésar Ferreira, mais conhecido como a drag queen Dimmy Kieer, são, ao meu ver, mais uma questão pessoal - relação de adversário com interesse pelo prêmio do jogo - do que questões de falta de respeito às diferenças de sexualidade.

Aproveitando o ensejo do frenesi provocado pelo BBB10, como também à luz da irreverência de uma drag queen e fazendo um link com o último post sobre Andy Wahrol, é que trago aos visitantes da minha casa o vídeo de Alisson Gothz, que revisitou o trabalho do artista e cineasta norte-ameriano e me emocionou bastante pela qualidade na proposta de sua arte.

28 de março de 2010

Exposição Andy Warhol, Mr. America

A Pinacoteca do Estado de São Paulo realiza, de 20 de março a 23 de maio, a exposição Andy Wahrol, Mr. America. Em números, o público pode conferir 44 filmes, 26 pinturas, 58 gravuras, 39 fotos e 2 ilustrações do pintor e cineasta norte-americano, que foram organizadas pelo The Andy Warhol Museum, de Pittsburgh, nos Estados Unidos.
Para os amantes da sétima arte, desde o último dia 20, há sessões com filmes do pop-artista. A programação cinematográfica segue até o dia 14 de abril, projetando suas películas nas manhãs e tardes da capital paulista.

Andy Warhol

Nascido Andrew Warhola, em Pittsburgh, Pensilvânia, em 1928.
Em 1945, ele entrou para o Carnegie Institute of Technology (atual Carnegie Mellon University), onde se formou em desenho pictórico. Após a formatura, Warhol se mudou para Nova York, onde trabalhou como artista comercial. Ele também fez trabalhos como ilustrador para diversas revistas, como Vogue, Harper's Bazaar e The New Yorker e fez trabalhos publicitários e vitrinas de lojas de varejo, como Bonwit Teller e I. Miller.
Profeticamente, sua primeira missão foi para a revista Glamour de um artigo intitulado "O sucesso é um trabalho em Nova York."
Ao longo da década de 1950, Warhol teve uma carreira de sucesso como um artista comercial, ganhando diversos elogios da Art Director's Club e American Institute of Graphic Arts. Foi nesses primeiros anos que ele encurtou seu nome para "Warhol". Em 1952, o artista teve sua primeira mostra individual na Hugo Galley, que exibiu quinze desenhos baseados nos escritos de Truman Capote. Seu trabalho foi exibido em vários outros locais durante a década de 1950, incluindo o seu primeiro show no grupo do Museu de Arte Moderna de 1956.
Nos anos 1960 é que a carreira de Andy Warhol culmina na reinvenção da pop art com a reprodução mecânica e seus múltiplos serigráficos, aludindo aos temas do cotidiano e aos artigos de consumo. Nesta década, ele reproduz as latas de produtos de consumo massificado, como a Coca-Cola, e também rostos de celebridades e personagens marcantes da história (reprodução em série com variações de cores).
Em 1987, após se submeter à uma cirurgia de vesícula, Warhol teve uma arritmia cardíaca, no pós-operatório, e falece aos 59 anos de idade, em Nova Iorque.

# Dados do filme (videopost acima) #
Mario Banana, filme estrelado pelo ícone gay da cena alternativa de Nova Iorque, Mario Montez.
O ator foi uma das super-estrelas dos filmes de Warhol, aparecendo em 13 de seus filmes.


Serviço:
Pinacoteca do Estado: Praça da Luz, 2 – fone 11 3324.1000
Estação Pinacoteca: Largo General Osório, 66 – fone 11 3335.4990 -
Abertas de terça a domingo das 10h às 17h30, com permanência até as 18h -
Ingresso combinado (Pinacoteca + Estação Pinacoteca):R$6,00 e R$3,00 (meia), entrada gratuita para menores de 10 anos e idosos acima de 60 anos anos.
Grátis aos sábados.

23 de março de 2010

Verbete rasgado (dedicado às 'santinhas')

É pandemia.
O tesão colérico na veia de todo mundo.
Lava-se no banho e continua imundo,
Sem tratar as feridas genitais.

Dizem da pureza da santa;
"Melhor ser filho da outra"
Que sangra vida solta,
Escorre, lava, sara e transmuta;
Bombeia a cólera e concentra no ponto,
Um corte que rasga puta.

Vacinam o homem indelével,
Esboço de varão, com orgulho.
Leva em si o âmago na ponta da agulha.
Fura o rastro canino de uma só fagulha
De fogo e cólera, a incendiar vaidade.

Ele coça a coceira dela.
Ela se coça com a mão de pecado
Eu fico aqui todo suado,
Esperando o leite a ser derramado.
E a peste ronda e assola como febre amarela.

Então quem crava dentes no meu peito?
Quem arranca o pelo, como se tivesse fome?
O cão que atenta é o mesmo que consome.
A face santa cai, ao cio da banguela.
Em terra de brocha, quando se enrijece cacete...
Quem seria a rainha cadela?

21 de março de 2010

Falta

Esse vento que entra pela janela não traz a realidade;
Eu penso o quanto de misericórdia eu tenho de mim mesmo.
Eu não sei quanto de misericórdia eu preciso para mim.

A misericórdia não me trouxe a realidade que nunca chega:
A biografia que, há muito, quero ler;
A pessoa interessante que eu preciso me interessar;
Terminar o que comecei e começar o que nem sei.

Sair dos pontos sem privilégio que vou nos dias de tédio;
Como opção, tratar o que não necessita ser prioridade;
Priorizar o caminho ao encontro da formação crítica.
Eu penso o quanto de criticidade eu preciso abandonar
A respeito desses homens que é preciso ignorar.

Guardar firme no bolso o que não é troco e o que é;
Firmar compromisso com minha meta social;
Olhar de relance o que há de banal;
E derramar um pouco de leite num copo de café.

Esquecer os telefones constantes na lista de chamada;
Deixar o papo de misericórdia e dá, à vida, outra penitência;
Fechar a janela na ventania e ligar para o que importa;
Tornar mais cedo o começo do dia e, ao abrir a porta,
Sair em busca: as sobras de casa não suprem ausência.

Imagem capturada de Edgewater Technology Weblog

12 de março de 2010

O muro perfeito para a incerteza

Entre a desconfiança e a certeza há uma lacuna onde a cogitação habita. Um habitat inóspito sobre o alicerce da conjectura. Suas vigas de possibilidades não sustentam confiavelmente o telhado de vidro que cobre de probabilidade os relativos [in]cômodos.
Eu entrei neste lugar sem mínima atração de moradia. Apenas pude constatar um habitante: há uma curiosa figura que possui duas faces, mas ainda não sei, ao certo, qual é a verdadeira e qual é a fantasia.
Passou algum tempo e eu também abri as portas da minha habitação. Convidei a incerteza para entrar, a fim de que ela pudesse confirmar, em face às suas dúvidas e, quem sabe, projetar-se no meu exemplo simplório - no entanto pleno de veracidade - e mudar sua atitude de indecisão, até que a máscara caísse e eu pudesse ver seu semblante real. Ainda não ocorreu...
Um outro tempo se passou e não vejo a tal incerteza. Ela não deu às caras por aqui, nem como, de praxe, após seus momentos prioritários para, assim, após o deleite em sua preterição, na condição coadjuvante que me faz parecer esperando por ela, gozarmos de horas afins. Gozo do qual ela necessita fortuitamente para que, talvez, decida de qual lado do muro que a suspende, pondo-a no patamar da abstenção, ela caia, pendendo, e se faça menos onerosa do que a contradição dos seus olhos que dissimulam.
Entre a desconfiança e a certeza há, ainda, a lacuna onde a cogitação habita, onerosa, avessa, descomprometida, no centro de sua atenção sobre si mesma. Lugar comum que ela fica e eu não consigo alcançar. Eu, do lado de cá, não posso tê-la à participação nos cálculos, nas teorias, nas comprovações. Ela, naquele lugar, à vontade fica para ter apenas, como bônus, uma comprovação em sua vida, diante dos meus olhos, antes à ela atentos: seu próximo passo é mais inseguro do que a falta de confiança em mim depositada; seu próximo passo, sem garantias de estabilidade, será em falso.
Em cima do muro, é o lugar perfeito para quem quer permanecer incerto.

8 de março de 2010

Colecionadores de nós

A Natureza dá o curso da vida, e nós, espécie humana, somos parte dela. Fazendo a hora, sem esperar muito acontecer, podemos intervir no destino e direcioná-lo aonde quer que queiramos chegar. Muito tenho escutado sobre os relacionamentos. Isso vem de amigos, de pessoas recém-conhecidas, numa mesa de bar, numa conversa informal no meio do mercado ou em qualquer lugar sem devida importância para o assunto, porque as relações humanas são conexas e não definem lugar correlato. Em todos eles, há sempre o que conversar sobre diversos assuntos, mas o que é contante diz respeito à afetividade. Pessoas se incomodam e se queixam das casualidades, querem sempre algo substancial para não ficar como uma mera ironia do destino ou incidente sem significado para o todo. Reclamam da fugacidade dos atos e são parte desses. Na verdade, a maioria não consegue admitir que, sozinho(a), logra a completude.
Neste fim de semana, alguém se queixava, a mim, das decepções, de manter um contato por algumas horas, certo dia, e no próximo encontro, coincidente, sequer ritualizar um cumprimento. “Vira até a cara”, reclamava o interlocutor. E onde vão dar os laços construídos em instantes de prazer, que não se eternizam, mas entram, sendo assim, no curso da vida? Eu diria que ali vejo apenas um nó, dentre tantos, e não laço. Somos colecionadores de nós. Não de gente, senão nós de fio, fita ou objeto linear, como, de costume preguiçoso que fazemos da vida ,coletânea de linearidade.
Eu, mesmo, tenho nós desatados, nós entalados, nós perdidos, esquecidos ou desapercebidos. Sobrepondo o eu, egocêntrico, egoísta, ou à parte de uma construção coletiva, somos responsáveis pelas sequências de nós que, colecionadas, incumbem-nos na função de colecionadores, curadores e divulgadores do nó cego de cada dia.
Há sempre uma desculpa para que queiramos afastar de nós a responsabilidade de desatar nós ou incinerá-los e construirmos laços mais firmes, reais, em vez de ficarmos nos queixando da solidão, da falta de companhia para qualquer momento, dos negligentes minutos onde sequer temos um olhar ou um ouvido atento, a fim de acompanhar um suspiro, um sussurro ou um grito. Escuto as mais variadas desculpas neste curso que transito, “enquanto não resolver questões profissionais, não há como pensar em ter com alguém”, “quem eu quero não me quer, quem me quer não desejo”, “minha vida deu uma guinada (...) aconteceram tantas coisas”, para dizer que não há vaga para mais um no carrinho da montanha russa emocional. E no fim das contas, ele(a) está só. Sobrepõe questões, que poderiam se desenvolver concomitantemente, sob a desculpa de que depois de resolvidas é chegado o momento para o olhar intencional ao outro.
Enquanto este momento não chega, é a hora da diversão, do conhecer pouco a pouco - nada mais é que outra desculpa para não estar sozinho e não se sentir responsável por aquilo que cativa. Então lembro duma canção de Chico Buarque onde, como eu, não quero me retocar no salão de tristeza onde as outras penteiam mágoas. Assim, diplomaticamente, tenho de escutar a mágoa, sob o discurso da queixa, da desculpa, da descrença no outro, da prioridade 'minha,' etc., confirmando que recalque de beleza e prazer é fungo brabo no couro cabeludo de muita gente.

Imagem capturada de http://ninguemle.org/tag/nos/

6 de março de 2010

A Semana

Toda segunda-feira é quase a mesma coisa:
Um intuito de qualidade de vida;
O início de uma dieta quase sempre fracassada;
O dia chato para programar uma saída noturna,
Despretensiosa, a fim de mudar o clima.

Então chega o dia após o dia chato
Terça-feira para começar a aula de francês
Ou uma atividade cultural
Distribuída entre os dias de hoje
E dois dias após a primeira aula semanal.

Quarta-feira de programação entediante
Desde a programação da TV aberta
Até os avisos da previsão do tempo;
Esses não parecem preverem completamente
A ingratidão sísmica dos dias brancos.

Levantar-se numa quinta-feira,
Abrir uma janela que isola o mundo
De um quarto apagado;
Deixar o sol entrar e pensar:
Hoje é o último dia de preços em conta no cinema
Até o início da próxima semana.
Ver a vida como um filme habitual.

Das oito às dezoito horas, afinal,
Tudo pode parecer normal.
De longe.
É o dia da sexta-feira brasileira,
Dos goles sem compromisso
E do calendário laboral cumprido.

Há gente que guarda o sábado porque divino é.
Há gente que acorda mais tarde e faz noites demoníacas.
Há mais de milhares de anos, há os que creem
Que é o último dia de trabalho de Deus na sua criação.
Dia das incertezas; dia da fé de cada um.

Manhãs mais brandas; noites periféricas,
Centrais de ócio e deleite de finalização.
Descanso, enfim, aos moldes da cultura mundial.
São contáveis, em sete, para história
O pouco, quase nada, dias banais.
Como incomodar e, sutilmente, fazer falar
Os desgraçados silêncios dominicais?