26 de novembro de 2010

Desde ontem

Eu não falo tua língua.
Tuas línguas ensopadas,
Numa estrada infinda,
Que eu já não busco
Aos olhares cegos das campinas.

Mato, areia, águas...
Prata, ouro e tesouro perdido.
Imagina o tempo a capturar
Líquidos que escorrem leves,
Minérios que ornamentam outros,
Vegetais que não me vestem nem me escondem.
Tenho eu de esconder-me de um minerador?

Vê a marca no meu braço, desde ontem:
O teu silêncio e a minha resposta à deriva.
Da boa vista, só me resta o astigmático
Que me fiz ao nascer muito depois de uma festa junina.

Existe o homônimo traduzido
Do latim; expressões forenses aprendidas
Não me servem de nada
Nesta cidade esquecida, desde ontem.

Existem a natureza e a captura.
Existe a fuga de cada viagem, desde ontem.

Cada partida, um entusiasmo se alcança.
Lembra aquela estrada infinda?
Lembra aquela bobagem dita?
Recorda o mais alto alcançado!
Cada chegada é bem quista, desde ontem.

Imagem: May 2

25 de novembro de 2010

Festa na Capital

[...]

"Bombas na guerra-magia
Ninguém matava
Ninguém morria...

Nas trincheiras
Da alegria
O que explodia
Era o amor."

[...]


Gal Costa cantava a Festa no Interior, de Moraes Moreira e Abel Silva, no ano em que eu nascia. Era começo da década de 1980, anos nem tão pacíficos quanto os atuais. No entanto, a canção de 1981, fazia analogia aos ruídos e cores da guerra de outros olhares, que visavam ao carnaval do ano seguinte. Explosão de sucesso.
2010, na cidade que possui o carnaval mais famoso e alegre do mundo, Rio de Janeiro, o dia de hoje foi marcado por uma guerra de combate à criminalidade, uma festa - sentido alegórico para a repercussão midiática - onde civis e militares transitam entre fogos devastadores e trincheira armada as quais dão vazão ao medo.
No epicentro da tragédia social - Vila Cruzeiro, no bairro da Penha
- nada é muito fantasioso: unidades do Caveirão (carro blindado do Bope) e seis tanques da Marinha, do modelo M113, municiados com metralhadora .30. E contabilizando números milicos, já são, até a tarde desta quinta-feira (25), 350 homens, sendo 200 da Polícia Civil e 150 do Bope.
A operação policial foi resposta aos ataques acontecidos no último domingo, que, desde lá,
quando criminosos atacaram as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), trouxe uma onda de violência à capital fluminense, com arrastões, veículos queimados e ataques a forças de segurança.

Repercussão

O carnaval nem a guerra podem ser considerados eventos divinos por uma sociedade de maioria cristã, como a nossa, certo? Mas vox populi vox dei: o povo começa a manifestar suas impressões, sobretudo por meio de redes sociais. O Twitter, por exemplo, que oferece um medidor, elencando verbetes e expressões hashtag (denominados Top Trends), foi dominado por opiniões referentes ao evento no Rio de Janeiro. São pessoas desejando #PaznoRio; outras, mencionando personagens dessa terrível história. Há também a contabilidade dos números cruéis, que até a tarde de hoje, já somam mais de 20 veículos incendiados, 11 presos e cerca de 10 mortos.

Violência generalizada

A Violência não é caso isolado no Rio de Janeiro. Ultimamente, são expostos na mídia fatos que vão além da clássica mocinho e bandido: gays sofreram atentados homofóbicos, em São Paulo; o crescente número de moradores de rua assassinados em Alagoas, etc.
Quem vive de fonte extra-oficial não morre desinformado. Esta semana, soube que o município de Águas da Prata, a 238km de São Paulo, teve seus dois primeiros homícidios de sua história.
É a violência chegando a rincões de pouco mais de 7 mil habitantes.


Fontes: Yahoo!/ G1.com / GloboNews
Imagem: http://travellingboard.net

Viagem Maldita

Os filmes de terror me dão um certo medo. Lembro-me de que, ao chegar em Campinas, para morar, a primeira sessão de cinema a que assisti foi uma película do gênero. Desde lá, já vi alguns outros e eles sempre causam um impacto até umas horas após a ascensão dos créditos. Para contextualizar essa história, estou estudando o cineasta David Lynch, no Museu da Imagem e do Som (MIS) de Campinas. Um curso tardio para um espectador-curioso tardio. Eu deveria ter dedicado espaços de um de meus hobbies favoritos ao artista há um bom tempo: antes tarde do que nunca.
Comecei a entender o porquê de meus companheiros de pós-graduação ovacionarem
Twin Peaks, nas discussões em sala de aula. Ainda não vi a supracitada série, mas conheci um pouco sobre ela e seu referido diretor e roteirista.
Por meio deste curso oportuno, gratuito e instigante, conheci outro autor que, tratando-se da sétima arte, utiliza de elementos críticos à cultura estadunidense, desdenhando com símbolos patrióticos - como hino e bandeira nacionais -, agregando, à tensão diante de imagens violentas, valores importantes para sacudir a opinião espectadora, geralmente, acostumada a ser massa consumidora apenas de mais um tipo de entretenimento. Estou falando de
Alexandre Aja, cujo nome surgiu em meu rol de know-how, pela primeira vez, na noite de ontem. Nunca tinha antes visto um filme de terror enviesado assim. Achei bacana a genialidade sutil que fora de um curso, talvez, passasse-me despercebida por ser apenas um thriller no repertório de visualidades. A propósito, o titulo assistido foi Viagem Maldita (The Hill Have Eyes). Fica a dica aos amantes do gênero ficcional ou para quem compra a ideia do engajamento plural de um sucesso da telona.

Imagem: capturada/Portal The Best Horror Movie

24 de novembro de 2010

O dia em que a terra parou

Fomos prudentes desde o começo do mundo. Olhamo-nos discretamente para não acordar os dragões que nos devorariam entre os risos nobres dos bêbados. Quanto fogo sairia daquelas bocas e incineraria pretensões, por descuido! - pensei, no outro dia reflexivo.
Águas corriam, ruidosas, enquanto meu relógio apressava a tomar alguma atitude, antes que o tempo fosse inimigo da minha tímida solução temporária: uma conversa sobre amenidades, uma defesa enraizada e um brinde presunçoso à minha desconversa defensiva.
Entre goles excessivos da graça, eu fui me enquadrando, cada minuto a mais, na homogeneidade festiva. Brindávamos à vida e às coisas fúteis que nos distraem porque são necessárias, ante à correria por um espaço fora do útero social. Cada minuto, também, martelava a sentença - veredicto de derrota - de uma nova memória de pele. Essas histórias sempre me fascinaram, ainda mais quando o protagonismo me arrasta para seu elenco.
Nesses enlaces sociais, as aparências contam muito. Quem avalia à primeira vista repara bem no que você informa, através de seus gestos, de seu apego e de seus acessórios. Não há intuito infalível, ainda que você queira agradar. O agrado é outra maneira cordial de se fazer marcado e ganhar destaque quando a unidade pinta apenas monocromias. No entanto, mais importante é, entre croquis de romance entrelinhado, sê-lo tal qual risco íntegro.
A loucura está bem próxima da embriaguez, tinha certeza disso. É... caí no passo dos goles impávidos, ainda que tremesse em certos momentos. Obviamente, o movimento dos olhos, braços e direção de palavras já tinham mostrado que eu era foco de uma observação incessante. Não habitual me sentir confortável nessas situações avaliadoras: uma palavra torpe, uma opinião insensata, qualquer que seja o semblante... tudo transparece meu estado de distração inacessível. Eu sou refém brando, entrego-me à simpatia de belo sorriso e uma prosa afim.
Acredito, ainda, que haja uma cortina imaginária a fim de não revelar os bastidores... Nada muito além da prudência que não oscilou desde o começo do mundo. Eu já não sabia em que Era alucinada estava, dessas de peneiras que não tapam sol nem escondem os raios de luz da lua, tampouco. Sobretudo, assuntos de quarto, com porta fechada, ficam entre as quatro paredes e os seus personagens. Não há mistérios a anunciar mais algum capítulo sucessor.
Fomos prudentes desde o começo do mundo.
Ele gira. A rotação não transgride o tempo em mais que algumas horas.
Em um dia, apenas, é válida a mão que acolhe a outra e, cúmplices (já dueto), contidas no prazer de, iguais, posarem sobre si mesmas, num movimento embalado pelo desejo...

Em um dia, apenas, é preferível a conversa indireta, sem muita pretensão de ser eterna, mas suceptível a esquecer ponteiros e números...

Em um dia, apenas, é instável meu anseio por querer outros dias semelhantes...
Assunto, creio, não faltaria para outros capítulos, nem preocupação com o tempo.
Fomos prudentes desde o começo do mundo e sabemos que ele ainda está condenado às suas rotação e translação.
Nada me convence mais do que minhas próprias convicções, porém estou, sempre, aberto a novos questionamentos, desses à Raul, que intriga sobre qual foi o dia em que a terra parou?

Imagem:
Earth from space with shadow (capturada)

22 de novembro de 2010

Condições atmosféricas

Quanto mais a rotina em desuso, maior a probabilidade de, nesses outros sopros, haver algo diferenciado: sair do curso do vento que sopra sempre a mesma beleza. Não há nada tão feio, exatamente. O vento traz grãos incômodos - então, há necessidade de fechar os olhos - mas refresca caminho. Portanto a frescura, ainda ela sozinha, já é um alívio.
Quando existe a alternativa, ainda que breve, importo-me com ela. Se ela trouxer o entusiasmo, que seja bem-vindo como abraço estranho, que se torna íntimo à medida que cada nuvem é soprada para mais longe, sobre a cabeça. Virão outras nuvens... passarão outros metros cúbicos de água neste rio passageiro: mudança. Aí, percebo que o igual não é tanto quanto parece. Não será diferente, caso eu não queira. Importante é ser menos igual, porque igualdade só é boa quando o viés diz qual ângulo.
Quando se trata de permuta, revelações podem facilmente ser confundidas. Terreno perigoso, cheio de pedregulhos. O melhor é permanecer firme em qualquer lugar que se ande. A firmeza é caráter e a mobilidade é um cenário para qualquer tipo de transeunte. No entanto, se está fincado, só chuva forte ou terremoto pode mudar.
Mudança é a concepção. Vale-se, então, do direcionamento. Permita-me o tempo deixar soprar o vento, transitar por ele, tremer à insegurança e observar onde todos estão indo. A minha opção vai além de uma, mas, principalmente, em seguir o comboio ou escolher outro passo.
Um segundo apenas pode ser perfeito. Um dia pode sê-lo. Um noite pode escurecer o brilho.
Muda, revela e direciona: não estou falando do vento.

Imagem: capturada do portal da Fuvest

4 de novembro de 2010

Religioso nominal

Há muito tempo não há um comitê de ideias. Elas estagnaram no momento que eu cedi espaço às preocupações em detrimento da minha bênção que, ao contrário do que se prega, não vem por cessão, senão por busca. É assim, um tal de 'Deus ajuda a quem cedo madruga'....
Outro agravante é a insistência do corpo insano - reflexo de um espírito perturbado - a usar a palavra de afeto quisto e a necessidade da minha antiga e usual atenção, que consumiu por quase um ano meus resquícios de tolerância. Eu não posso continuar a tratar os loucos enquanto me torno um, sem assepcia ou água benta (benditas sejam minhas mãos a curar minhas próprias feridas). Não vou abusar força superior alguma para mudar a situação que eu mesmo permiti. Somente eu fui responsável pelas pegadas no deserto à esquerda, quando passei pelo cruzamento da via lúcida com a alameda das inconsequências.
Assim, fui até às raízes da sinceridade e do apoio moral, beber o gosto da coragem. A covardia sempre perseguia, parecendo motim de ruína. Ora eu enxergava a dor, ora eu lembrava que o elixir estava diante do meu paladar ingestor de conta-gotas de felicidade. Encontrei a paz por uns dias e os abraços eloquentes de veracidade. Sabe aquela união que faz a força sair do enclausuramento e energizar o anseio de algo melhor? Estava presente em cada olhar direcionado à minha vida, associado à palavra humana entre um ou outro fôlego de respeito. Nesse turbilhão entre escombros, a viga da autossuficiência estava partida em pedaços pequenos de insalubridade: não mais cri que ela se re-ergueria. Sobre mim, ainda estavam a promiscuidade pretensa do corpo alheio a solicitar o que tenho de mais susceptível à putrefação, o orgulho pouco que culminou em desistir de buscar aquele que desdenhava desde a vez primeira e o laço rasgado pelo tempo e desgaste da separação. Ainda assim, eu não era uma vítima; não se publicava que um corpo foi encontrado; esquivei-me da contabilidade dos perecíveis, no entanto não me tornava um imortal (sonho irreal). Dentre essas coisas tantas que letalmente poderia hipotecar minha vitória, parando na mão de outrem ou entregando-me ao desespero - de tanto minha amada mãe alugar santos -, santificado seja qualquer nome que pudesse dizer para mim que não hei de estar sozinho. É gente demais a abandonar à escuridão da primeira sequela, que, assim, percebo que além dos iluminados sob o sol nordestino, na capital alagoana, a consquista da confiança e solicitude de um anfitrião vem em marcha-ré, numa charrete do século XVIII, com seus cavalos cansados e analfabetos do passo contrário ao ensinamento da direção certa. Não posso e, talvez, não por orgulho, não queira mais a existência das falsas promessas. Apenas não quero promessas, porque os resultados são cobrados a taxas exorbitantes de juros. Portanto, ao primeiro sinal da execução em níveis vitoriosos, a mão que emprestava se une à boca e aos olhos, elegendo sentidos para cobrança colossal.
Por descrença parcial nos homens, passei a rir das bestas; não gostaria de rir ante àqueles que se incomodam com qualquer indício de felicidade: vão lá e... Perderia mais ainda!
Voltei a louvar os segredos e meu calo mais dolorido: somente eu sei onde piso e onde estão escondidas as forças que eu deixei isolada desse circuito de falsidade, que já roubou de mim as mais belas cenas de otimismo, porque revelei alguns lugares da minha gratidão e vontade de viver.

Cansei de gente que chega para lamber, morder e deixar ardido. Entre mim e a minha paixão por todo o trajeto, agora, está meu advérbio imperador em matéria de dizer NÃO.

“...imediatamente cantou o galo. Então Pedro se lembrou da palavra que Jesus lhe dissera: antes que o galo cante, tu me negarás três vezes.”
(Mateus, 26: 74, 75
).


Imagem: La Negación de San Pedro (Pasión de La Sagrada Familia), por Juan Pablo Valenzuela