O Crime do Monarca
Nenhuma faixa ou placa de aviso indicava o reino desconhecido no fim do túnel. Lá, tudo era quase nada; era ínfimo porque havia ainda resquícios do silêncio e som. Um não suportava a presença do outro. Ora, denunciavam-se os ruídos de sobrevivência; ora, o dedo indicador imperava transversalmente sobre os lábios da inexistência: calavam-se todos os rumores...
Às 27 primaveras de andança, a Policromia resolveu desbravar o lugar de ninguém, como se fosse sua solitária cruzada para catequizar a própria alma, refletora de si mesma – uma espécie de retiro à parte de um mundo de enlaces descartáveis. Entretanto, ela não poderia imaginar que o Preto teve igual ideia, mas com propósitos particulares de fuga dos holofotes ameaçadores de sua identidade ausente.
Assim, estabelecia o encontro inusitado de quem é de sinérgica consciência sobre cada nuança da vida com aquele que, de má fama e timidez, tomava a coroa e sentava ao trono na ausência de tons, quando a retina ociosa abdicava a monarquia.
O tempo já denunciava necessidade de ajustes no império dualista. O Preto não queria ver as cores quentes na primeira manifestação de cálidas insatisfações que a Policromia se queixava, aproveitando o protagonista silêncio das horas em que os rumores estavam a léguas da terra nativa. No entanto regressaram, porque já havia boatos, a intuir a possibilidade de desafeto em território aquém dos movimentos essenciais de vida.
O Preto resolve – fugitivo de ruídos – ausentar-se.
A Policromia resolve – combatente a silêncios – capturar presença.
Aquele dia não poderia deixar de ser um marco para a união de sentidos. Não havia ninguém para presenciar a ausência de cores (Preto) e o lamento da Policromia, que unida ao som, desesperada por alguma notícia, clamava ao partícipe de uma fuga:
- O dia, com todas as cores, seria alegria, seria perfeito, se não faltasse o Preto!
Mas parece que o partícipe cumpriu seu sentido no crime: permanecer calado, sob a lei do silêncio.
A Policromia desde ali viveu à paisana.
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