18 de março de 2021

Pane no sistema

O impressionante lugar da gente é ambiente imperfeito com suas dilacerações e remendos. Tive que olhar para o conjunto da obra; os detalhes pequenos no tamanho de sua pequenez deve ficar. Um lugar lindo cheio de opostos para lidar, uma sucessiva alteridade a cada ato de fala ou escuta. Entender o outro mais do que contrapor-se, é um desafio, confesso. Décadas de vida me fizeram experimentar aliados e opositores. Quanta ameaça e quanta desunião! Tem gente vindo de todo lado com as armas que têm para matar, roubar e destruir. Ora, um arranhão; ora, um estilhaço, pedaço de mim arrancado com a  falsa fome de quem só quer morder e cuspir fora. Onde estava unido, eu, diplomata da paz e bem, reforcei laços para não sucumbir à prova. Minhas armas brandas de diálogo e contundência para, quiçá, fingir-me de morto, de louco ou de otário. No interior, uma erupção vulcânica de lavas paranoicas, na quentura do delírio e excesso de irracionalidade. Suportei aquele derretimento como a frieza que conseguia, mas a razão das oposições são contraposições. Eu estava sempre tentando o equilíbrio térmico. Não mais que estava sendo eu mesmo, mesmo que perdesse por vezes a racionalidade. Apenas não conseguindo equilibrar o fluxo de energia. Ontem foi um dia assim...

Há um ano em pandemia praticamente, tive meu quarto ataque de pânico. Há bastante tempo sofro de ansiedade e -  menos mal - já tive orientações clínicas para o assunto. Poderia ter tido mais, acredito, no entanto consegui controlar a ansiedade muitas vezes para não ocorrer uma descarga como a de ontem. As notícias sobre as mortes por Covid-19, as pressões profissionais às quais tenho me submetido, a distância dos meu entes queridos e alguns problemas pessoais dos meus dramas cotidianos me fizeram quase no fim do dia acelerar o coração, sentir meus membros dormentes e gélidos por mais ou menos cinco minutos. Senti-me apavorado como se estivesse tomando doses tóxicas de algum veneno. E estava!

Decidi escrever este relato para que possa ajudar outras pessoas que estejam sofrendo da mesma coisa. Se tiver a opção de ter acesso rápido a um profissional de saúde, faça isso. Eu já procurei alguns, revi os meus níveis hormonais e descartei a hipótese de desequilíbrio neles, mas o fator não é apenas bioquímico. Li um livro da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, por indicação de meu psicólogo em Maceió. Acho que o ponto interessante da leitura é a informação de um profissional com conhecimento do tema. Ali encontrei uma geral sobre os transtornos, no entanto algumas característica batia exatamente com a angústia vinha me sentindo. Pois dali em diante, tento evolui no autoconhecimento. Entretanto imagino que algumas pessoas devam ter dificuldades de ter uma acesso holístico a sua saúde. Alguns remédios são possíveis, como enfretamento e solução. Há aqueles de prevenção mais fáceis, como atividade física (sim, estou em dívida), produção ou suplementação de vitamina D (já fiz e acho caro, mas ainda bem que temos sol disponível; é bom sempre procurar se informar do tempo ideal para receber a luz sem danos à pele) alimentação menos agressiva (evitar alimento processados e ultraprocessados ajuda bastante!); e a conversa, um canal de afeto sempre faz bem para colocar pra fora o que esteja sentindo. O equilíbrio emocional é uma expectativa mais difícil, porque, sobretudo, em tempos complicados que estamos vivendo muito foge ao controle e alguma coisa não depende só de nós mesmos. O importante é procurar ajuda se você não souber como vencer isso sozinho.

4 de março de 2021

jiboias em março

nesta manhã não foi o ato de acordar
que me fez acreditar em novo dia;
nada foi tão novo,
pareceu até dia repetido
como tantos outros,
e à noite,
à espreita de minha mão tremida,
sosseguei-me dentro de mim
como uma jiboia após devorar galinha-
há alguns dias sem me alimentar -
mas de onde vem rara energia? -
porque a fome ficou ali no começo da paz,
no fim do sossego por esta mudez,
não se fala de boca cheia! -
e qual semana terei força ao acordar? -
ainda que eu tenha os cacos espalhados
para organizar este vidro partido:
o anel que ganhei no dia já esquecido.