29 de outubro de 2025

Não me ame tanto

 Assim que você saiu da sua zona de conforto e veio provocar a minha, dentro do meu espaço já abarrotado de recordações e sentimentos dispersos, com a mais bonita de todas as promessas. Havia um sinal de alerta, eu já lhe havia dito, todo terreno desconhecido é cheio de histórias que não conhecemos e será tão difícil fertilizar. Não escondi nenhuma ferida, nenhuma crateria, essa sequitude e asperezas de codições adversas, minha fluência por caminhos desconhecidos também me causa medo e angústia; até isso lhe havia avisado. 

Você veio brincar de seu primeiro amor, brincar com alguém que está desacreditado no amor, mas que não é um canalha. Eu não sou um canalha! Você veio bricar com todas as suas idealizações sobre o mundo e sobre mim, com seu jeito e tenra idade, as primeiras aventuras do seu ex-futuro para sempre, conto de  fadas de pouco mais de duas décadas de criação. Amor, eu sou um monstro nesta fecunda história de homens e bichos. Por dentro de mim há uma ruína ainda em chamas, fogo por todo lado, e já não acredito que foderemos até amar-me, desisto!

Fui seu brinquedo de família feliz, um bicho de pelúcia rígido nas malemolências da imaginação. Um parque de estimação, o brinquedo mais generoso e paciente. Tantas horas, tantos sonhos, tantas promessas. E nada de concreto existia até que você veio e como uma criança que chora, corre para o quarto do pânico, escondendo-se do mundo. Até ali, mil histórias que você crio, outras mil inverdades... Poderia ser o cheiro de cigarro, o tamanho do espaço, a falta de planejamento, de conhecimento, de direção. Perdeu-se ali, no quarto do silêncio. Silenciou-se diante de mim e de todas as medidas cautelares. Perdeu-me de vez porque queria perder. 

Deixou-me machucado, já havia mil pedaços que eu já havia juntado e estava colando. Jogou-me um balde de água fria - esta tão mal disfarçada confusão, que você fez! Eu, acostumado a banhos frios, terra fria, solidão, sei juntar o tempo e meu espaço de volta, tudo está escrito na mão, um manual de sobrevivência que desde maio eu já esfregava com ácido sulfúrico, soda cáustica: apaga as linhas tortas que me orientarama  chegar aqui e descobrir que não sou um canalha. É que amor demais me faz tirar os pés do chão, porque meus ímpetos de fantasias sempre me fizeram voar alto e cair da distância de um convite - sempre - de alguém tão distante. 

Daqui para frente, o de sempre: um plano, o plano b, os sonhos enterrados, todos, e o terreno despropriado. Deixou-me aqui aquela peça íntima, já lavada, com cheiro de novo (lavou, está novo!). Deixou-me aqui também espaços que não lhe cabem mais, a minha casa é vazia até de mim. A temida casa do caralho! O lugar que sobrou para mim. Esqueça o amor, "eu tenho algum problema com amor demais..."