Não cabe ninguém em mim.
Eu estou transbordando...
As abstrações são pesadas e flutuantes,
Meu chão firme que parece me engolir às vezes
Faz meus pés afundarem em imaginações diversas.
Não cabe mais de mim em ninguém.
Sou denso e completamente cheio de mim mesmo.
Transbordo por vastidão de desconhecimentos,
Já que sou apto a conhecer todos os lugares possíveis.
O mundo tem ficado mais apertado,
Mais perigoso e infinito de história.
Não cabe a América Latina em mim,
Com suas tradições invadidas,
Com suas abstrações apagadas.
Não cabem mais memórias destrutivas -
É um novo momento para todos nós.
Não cabe uma gota de orvalho
Neste mar de lama sob chão firme.
Água e terra se entrelaçam:
Que meleira fizemos da noite para o o dia!
Que sujeira fizemos ao descartar nossas memórias!
Não cabe o oceano de mágoa.
Não cabe o vento que soprou em direções distintas
O muro com tintas escapa à superfície,
O que separa não tem cores.
Ausência de cor, o preto absoluto, acabou a luz.
Não cabe em mim a escuridão.
Todos os dias, de manhã,
O céu é convencimento ditador.
Não cabem coronéis em tempos republicanos.
Não cabem aqui talvez duas dores.
Não cabe um. Não cabe ninguém.
Existem dois lados sempre.
Existem, sobretudo, outros lados.
Não conhecemos muitos lados, nem lá fora.
Este medo constante do lado de lá.
Tempo de enfrentar o desconhecido.
Não cabe, por fim, este drama.
Não serão sorrisos fáceis, piadas superficiais.
Camadas de sonhos, de abstrações, não serão penetradas.
As placas se apertam e se chocam
Para jorrar o magma para o lado de fora:
Este denso peso das dobraduras e movimentos
Que escorre em calor e luz,
Em poeira e cinzas.
O chão será firme com uma camada a mais de história.