Estive pensando sobre marcos referenciais para uma vida aficionada em grandes êxitos; a dependência deles gera projetos que, por sua vez, direcionam-me às metas. Mas como lidar com a falta de prazos, libertar-me da expectativa ansiosa e o desespero de mais uma frustração?
Eliminar tais projetos implicariam numa desistência sem medida e, quando o tempo passasse, à frequência esquecida, eu me daria conta em considerações finais e enxergaria a profundidade, na qual metido, além de me distanciar da insistência patenteada há trinta e cinco anos, não me restariam forças para elencar minhas referências, em alguns capítulos.
Acontece que a vida foge à normatização científica. O todo maior que a soma das partes é bagunçado igual à licença poética de um texto livre das amarras gramaticais, editoriais etc. Para ilustrar a falta de protocolo para escrever minha própria história, aproximando-me da literatura e da engenharia da minha necessidade, abandonei o foco nos marcos referenciais, quer por etapas, quer por eventos, para bendizer meus valores em cada página deste livro não linear.
A culinária me traz o prazer de cortar aos bocadinhos, cozer e temperar. Esperar sentir o cheiro de cada erva, e acreditar no bom sabor. Arrumar o prato mais bonito e apresentá-lo aos olhos para que a boca tenha inveja do sentido e execute seu ato de degustar.
A minha sobrinha, amor consanguíneo contado em dois pares de anos e mais um pouco: quem me dá a razão em participar da semeadura geracional de uma novidade, com a prospecção da mais nobre colheita, de cuja participação talvez nem seja mais uma atividade minha.
A minha mãe devota da jornada socorrista; fundamento de tantas das minhas ideias e orientadora fiel sem retorno programado na sua espera. Como uma mulher que espera resultados, não a ela, mas a mim como único investimento. Gestora da arte de criar da melhor maneira, deixa-me hipótese a meu critério.
Meu pai que se ausenta pelo desprezo às teorias, mas, na prática, aparece timidamente para sob a fé do genitor. Não sei se por obrigação que pensa ter, mas é o no carinho diferentemente expressado que entendo o porquê de tanta diversidade no mundo.
Minha irmã, ao evitar problema em texto, contribui na paginação. Presente em todo manuseio. Não esquece uma página sequer, e cada qual forma o contexto.
Família é um capítulo único, pois nele se apresentam e se encerram ali a tese e antítese. São, num miolo de folhas, a síntese dos muitos lados da questão.
Já teve a dança, por gostar, mesmo, de dançar, por passar horas a fio requebrando todo o corpo e expressando o cerne da agonia; quebrar a monotonia de um só ritmo. Eram vários. Eu juro que não sei dizer porque não gosto mais de dançar...
Vieste tu, o meu português vernáculo. Aprimorei minhas habilidades na língua, resgatei-me à herança de uma invasão passada que tirou daqui o tupi e introduziu o novo idioma; o primeiro que aprendi, o primeiro que aprendi a amar, também. A facilidade desta comunicação. Fluência perfeita. A única perfeição. Deu-me regras gramaticais às quais me dediquei para fluir numa das melhores coisas que gosto de fazer: escrever. Ah, se não fosse a minha língua, a nossa língua, talvez eu nem conseguisse expressar um parágrafo do que é vivência. Talvez eu me bastasse por silenciar. Mas prefiro escrever, porque dizer é o que tenho, hoje, como conectivo de sobrevivência.
Lindo, Cris! Boa semana!
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