11 de setembro de 2011

Quanto tempo tenho


E se meu pai estivesse morto? Com ele tenho sonhado pouco, tenho falado pouco, pouco sabido de tudo. Nem a metade. - Alô, como vai, pai? - eu sempre tomo iniciativa para saber como anda aquele homem que agora já tem 60 anos, quase o dobro da minha idade. Ele me informou, com a voz tão mais tranquila, que o convênio médico autorizara seu procedimento cardiovascular. Aquela voz do outro lado da linha me trazia uma metáfora positiva, como quem dizia: "eu estou vivo e ficarei bem." Mas não era nada grave. Era o mais urgente, melhor. E eu como estou? Digo-lhe, pai, estou bem. Bem genérico.
E se minha mãe estivesse aqui em minha casa? Tenho falado todos os dias, ultimamente, para lhe dar certeza de que, realmente, estou bem. Ela se preocupa toda hora. É uma preocupação contínua. A pessoa que mais se preocupa comigo e que demonstra isso sempre que pode.
Estar bem é uma questão muito subjetiva. Devo explicar pormenores. Em pormenores, aliás, devo explicar cada pormenor; por maior que seja meu intuito de dizer que bem estou, falho.
A dinâmica familiar sempre foi um impulso vivo. Como é permanente esse olhar atrás só para saber que lá ficaram os que sempre à frente trago nos meus caminhos sob qualquer perspectiva angular. O mapa diz que estou embaixo. Pais, em cima. Questão referencial. Esses conceitos, blá, blá, blá...
No entanto, em cima de mim estão pedras pesadas. Eu tenho de quebrá-las no sonho. Acordo, vivo, para quebrar as do caminho. No trabalho, manufatura metafórica, pedrinhas, quase grãos confeccionados para soprá-los bem longe, espalhá-los pelo estado de angústia, e deixar que essa poeira se encarregue de carregar o vento ou que ambos desejem trabalhar em conjunto e daqui distar. Um sopro de paz, meu Deus! Um vendaval milagroso, com rajadas agressivas... É, já não sou mais crente.
Hesito em ver o caos, ainda que eu veja tudo muito turvo sempre. Mas não vou me enganar em ver as linhas paradisíacas que costumam cantar nesses festivais de estética temporária. O bonito há muito não me convence. Ele sempre tarda, atrasado e, quando chega, perecível, apodrece. Data limite. Tempo contado. Um dinossauro, indivíduo que jura, jurássico, conhecer tudo e determinar desfechos. Bonito descartável no tempo exato. Quanto tempo? Não sei quanto tempo tenho para ficar me preocupando comigo e com essa beleza que acaba.


2 comentários:

  1. sou perecível ao tempo, vivo por um segundo.

    a beleza só acaba para dar lugar a uma outra beleza. será que temos olhos para ver? ou será que estamos muito preocupados em perder?

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  2. Uma pedra de cada vez.
    Segure ela nas mãos, sinta a textura, o tamanho, observe o calo que casou aos seus pés. Entenda ela, não a chute apenas. Saboreia a sensação de ser, de estar seja lá como estiver, saboreie. Só assim a lance no vento, jogue fora, mas só se for preciso. Como diz Clarice Lispector, sabe-se lá qual pedras tem nos sustentado internamente.

    Abraço cara, boa semana!

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