30 de junho de 2010

Hibernação

Quanto mais ao Sul, em direção ao polo, a coisa vai esfriando. Tudo vai congelando: as extremidades, depois um pouco mais ao centro e, no meio do corpo, instala-se a geleira oportunista.
Tempo de hibernar.
Vem aquela sonolência a dominar o corpo; a inércia faz a mão parar de digitar códigos de um bem-querer que, por ora, deixam-se dominar pelo caráter animal à qual somos submetidos desde que optamos por este jogo de oscilação - chamado vida - entre ebulição e condição irreparável em determinado tempo. Não podemos ser diferentes em casos de perda temporária de sensibilidade, como se conhece por letargia. Há um processo metabólico, respondendo aos impulsos do frio, que faz os batimentos do coração diminuírem, e respirar sonhos não é mais incessante.
Recolhemo-nos no mais alto grau da temperatura alcançada, por necessidade de proteção e vigor até o momento em que possamos pôr de novo a cara de fora, a bater, porque é importante reagir ao clima e aí, sim, recomeçarmos com atitudes que partam da vontade, indo além das reações, apenas. Um dia agiremos, claramente, sob o sol vibrante e caloroso.
No entanto, é preciso ainda bombear o sangue, levando necessidade vital a todas as partes do corpo, ainda que com essa geada a qual lança seus cristais de gelo sobre a pele desprotegida.
Nossa relação com a natureza externa é muito mais impressionante do que possamos acreditar. Se o mundo muda, por que não nós?
E quando os lábios ressecados, do extremo frio, cessam suas mais empolgantes articulações, então o pensamento pronuncia, disfônico, sua queixa duvidosa: há algum coração aquecido como abrigo para quem cansou de uma cidade fria?

Imagem: Chema Madoz

26 de junho de 2010

Com qual sotaque você se identifica? Por quê?



Em julho de 2009, apresentei meu Trabalho de Conclusão de Curso, sobre Sotaque em Televisão/Preconceito Linguístico, juntamente com minha companheira de pesquisa, à época, a também estudante Christiane Patrícia, sob orientação do Prof. Dr. Aldir Santos de Paula, do Programa de Pós-graduação em Letras, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e a fonoaudióloga, mestre em Letras e Linguística e professora da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL), Gabriela Sóstenes. A pesquisa avaliou a aceitação do nordestino com relação à sua própria variação linguística (sotaque), quando emitido profissionalmente em Telejornalismo.
O trabalho foi feito a partir de embasamento teórico dessas áreas em torno da Comunicação, gravação de áudios - narração de nota esportiva - por 4 telejornalistas (dois paulistanos e dois maceioenses) e, em seguida, aplicamos questionário, avaliando as impressões que os ouvintes (juízes da pequisa) tinham a respeito do que ouviram. O resultado foi uma mostra do quanto uma estandardização de um tipo de fala em TV - os conhecidos padrões de voz no telejornalismo - pode acarretar em preconceito e autoaversão com o seu modo de falar.
Fiquei muito contente quando soube que a pesquisa rompeu os muros da academia e informou aos alagoanos sobre sua maneira de falar. A pesquisa foi mencionada numa matéria de televisão, apresentada pela TV Educativa de Alagoas, a qual compartilho, neste espaço, com meus leitores.
O Trabalho de Conclusão de Curso na faculdade foi um critério para obtenção do título de bacharel em Comunicação Social: Jornalismo, como também uma maneira de contribuir socialmente para refletirmos sobre nós mesmo.

24 de junho de 2010

De terra, de fera; quem era e quem pode voltar

Acabo de ler um relato de uma blogueira, por recomendação de uma amiga - quase conterrânea - que conheci pelas bandas de cá. "Muito forte" - ela salientou, após a indicação. Realmente, eu pude ver, pela narração: até que pontos chegamos, quando nos sentimos extremamente sozinhos.
Tenho buscado, com todas as forças, empurrar esta coluna que insiste cair sobre meu corpo; um peso grandioso, quase insuportável; não conseguiria descrever e continuarei lutando para não ter de presenciar ou viver situação parecida, nem comigo nem com um 'vizinho'.
Por mais que eu tente ocupar minha mente, há momentos que aquele pilar me incomoda ardilosamente, porque ele não sustenta nada e, aliás, o que era para ser sustentáculo, passa a ser dispendioso e custa mais caro do que qualquer empenho que eu faça para manter vigas de sustentação mais imponentes do que aquela, no decorrer dos dias que precedem o imprevisível e, com antecedência, parece prenúncio de uma tragédia colossal.
Eu vejo tragédia em tudo - isso é parcial, apenas. Meu pesar tem a fantástica elasticidade de tornar minha alma mais contorcionista do que meu corpo. E quanto a ele, eu já não tenho tanta preocupação, antes de preencher os espaços em branco, com qualquer centelha que saio catando na experiência retirante e desbravadora em detrimento da realidade confortável em longitude e latitude de outrora.
O negócio é impressionante por aqui. Faço parte do mais populoso Estado da nação. É muita gente, mesmo, e ao mesmo tempo são outras vítimas do desprendimento, esforçando-se para manter de pé os pilares dos seus apegos.
Aqui ou ali, pode despencar a coluna mais ameaçadora que existe: a solidão. Ela pende, em favor da gravidade, e quando vem ao chão, sempre cai sobre alguém. Existem homens e mulheres, a todo tempo, querendo impedir tal incidente.
Há quem busque na ocupação profissional uma maneira de desviar o foco, fazendo um plano cruzar outro e expandir possibilidades. Agora, estou com eles! Procuro, nessa abscissa, afastar-me da posição de queda, numa linha, imaginária, ou noutra, cogitar linhas de horizonte, pois elas são imprescindíveis para ir pouco mais além, visando à plenitude, ainda que imaginária.
Há quem busque também amores. Eu já busquei demais, mas eles não estão incluídos em etapa atual. Seria muita responsabilidade entregar-me debilitado às paixões entorpecidas de egocentrismo. Esta parte, não curto muito falar; não depende só de mim...
Assim, e infelizmente, acabarei somando forças à coluna que avança, unindo-me ao lado positivo da solidão, em ter de, em mim, ver apenas todas as coisas, dedicadas, e não esperar dedicação alheia. Não há - salvo exceções cada vez mais raras.
No dia em que eu estafar dentro de um apartamento, sozinho, posso crer: é hora de voltar para casa, porque tem amor de sobra por lá, para receber em abraço e companhia, exemplificando a saudade, que não é medida por palavra em uma rede social qualquer.

Imagem: Chema Madoz

Joanina, minha fia!

O que o Brasil conhece como caipira, na minha terra natal é matuto. E ser matuto no dia de hoje é plausível: comemoramos o Dia de São João em grande estilo. Ô, saudades!
Há festas das capitá ao interior por todo Nordeste brasileiro, muita comida típica, cenografia e músicas regionais (abro parêntese para não esquecer de fazer minha crítica: forró estilizado não me agrada muito). Então, recordo-me mais de minha infância saudosa, onde eu me divertia com as fogueiras nas ruas (hoje, por uma questão ambiental e de bem-estar físico, não tolero tanto). Lembro-me de D. Eunice, minha avó, que vendia fogos de artifício à época e meu avô, Sr. Sebastião, que esquecia do caráter mercadológico e sempre nos ofertava - a mim, minha irmã e meus primos - a possibilidade de iluminar mais a noite junina.
Bons tempos de escola também não passam despercebidos na memória, quando minha mãe comprava trajes típicos e nos enfeitava, com direito a chapéu de palha e maquilagem de simulação dos pelos faciais.
É... agora esta barba não é alegoria. É um estilo; é minha posição de homem que jamais esqueceria velhos tempos no seio de uma família que podia comemorar datas especiais como a de hoje.
Este ano, além de minha saudade cortante, há uma dor dessas águas que ferem, apagando fogos de artifício; ventos fortes que sopram toda devastação de canto a canto, pelo Nordeste.
Já não sei como está a comemoração por lá. Ontem, na TV, eu vi que, aqui no interior paulista, alguns lugares realizam a festa religiosa, algo bem parecido com meu lugar: fogueira, decoração caipira, etc. Acho que enrijeci com a idade, não senti a mínima emoção à coisa. Talvez haja um distanciamento físico, etário, factual, inoportuno a dizer que, em mim, só ficaram boas lembranças e uma vontade tremenda de poder comer milho assado.

Imagem: reprodução de 'Bandeiras de São João', de Yara Tupynambá
(acrílico sobre tela 0,40 m x 0,40 m)

22 de junho de 2010

O rato

O rato quer dizer:
'Não quero mais'.
Ou então que digam a ele.

O maior culpado por querer:
O rato
Porque se ilude.
Porque é sensível demais aos dejetos.
Mas não dá para ser diferente disso,
À essa altura da personalidade roedora.

"Tente abstrair muita coisa",
"Filtrar para não absorver tudo",
O rato escutara.

Não dá para filtrar tanto esgoto;
Ele segue com medo do gato.


Imagem: Divulgação Científica/USP

21 de junho de 2010

Águas que ferem





"Em Alagoas 22 municípios foram atingidos mais fortemente pelas chuvas, resultando em cerca de 70 mil desalojados, mais de 40 mil casas destruídas, 22 mortos e cerca de mil pessoas desaparecidas."
Como nordestino, criado no seio de uma família tipicamente nordestina, sinto muito esta catástrofe: minha sensibilidade está maculada ao encarar e lidar com essas tristes notícias.
O Estado de Alagoas está sofrendo. Pernambuco também chora sua dor.
Sinto-me triste por saber que além da capital, que já foi atingida pelas consequências dessa chuvarada, o interior alagoano é - onde a pobreza é ainda mais latente - o ápice de uma grande tragédia.
Os sites de notícias alagoanos atualizam os números, causando sempre uma pontiaguda lástima em nosso âmago. Hoje, são dezenas de mortos, milhares de desaparecidos, incontáveis desabrigados e um Estado que jamais esteve preparado para as águas de junho. E o inverno está apenas começando: agoniza ainda mais.
Hoje à tarde, felicitei meu pai pelo seu aniversário. Não sei ao certo até que ponto a felicidade dele é independente para celebrar o dia 21 de junho, mas a minha não está na potência máxima, depois de ver imagens e ler os textos que contabilizam mais e mais metros cúbicos de dor e temor.
Não dá para ficar imparcial com essa genética com um quê de mourisca e as doses anuais de sensibilidade familiar, pois elas só me fazem sentir uma agonia estranha e compaixão pelos alagoanos que não veem a "estrela radiosa que refulge ao sorrir das manhãs."
Meu Estado decreta calamidade pública; o presidente o visitará e promete liberar recursos para tentar reconstruir o que foi devastado, sobretudo a autoestima do povo alagoano.
Dói ainda saber que é orçamento paliativo, remediar feridas abertas e lavadas com água de chuva forte; é muita pouca cânfora para alma de quem já chora nos meses que antecedem o doloroso inverno nordestino.
Sensibilizo-me e peço para quem ainda não pode ajudar com donativos, ao menos, divulguem a ideia da doação, em suas redes sociais, com seus instrumentos de solidariedade e trabalho, na esperança de que um dia nasça o sentimento e a atitude preventivos.
E que choremos apenas o que nossos corações e nossa força não puderem precaver!


Lista completa para doações: http://www.asfaltoliso.com.br/donativos/alagoas-e-pernambuco/

Imagens: Assessoria de Comunicação do Corpo de Bombeiros Militar de Alagoas

É inverno, e daí?

"Não choro mais. Na verdade, nem sequer entendo porque digo mais, se não estou certo se alguma vez chorei. Acho que sim, um dia. Quando havia dor. Agora só resta uma coisa seca. Dentro, fora."

Imagem: Chema Madoz
Texto: Caio Fernando Abreu

14 de junho de 2010

14 de junho: Dia do Solista


Consoante Silveira Bueno, Solista é a "pessoa que executa solos musicais.", referenciando, na página 527 de seu Mini-dicionário da Língua Portuguesa.
Desculpem-me solistas do mundo inteiro, não quero tirar o mérito deles, mas me recuso a discorrer mais do que o significado da palavra, e felicitá-los por sua data: de forma mais universal, congratulations!
Peço emprestado, aos músicos, o verbete que a filologia lhes deu, e decido abranger sobre meu solo do cotidiano, ultrapassando à classificação musical, em face à itinerante audiência que, há muito, deixou de ser a complacente plateia à conquista para assumir seu ímpeto maléfico da desafinação. Portanto, meus resultados, quando têm sido de alegrias, somente posso compartilhar por telefone, brindar em sonhos, e não há um abraço in loco, antes das minhas queixas a qualquer parede desta casa.
Todo desafio não deixou de sê-lo mesmo, o marco quase sempre é abandonado antes da parada para descanso, metade do caminho é pouco e, no fim das contas, há mais uma máxima egoísta: há dois pés acusadores e a voz calada por uma carreira solo.
Terminei uma semana cansado de dizer pela metade, de entalar com o predicado; ainda na primeira metade do mês. Acho que meu pai me acostumou a dividir a esperança em quinzenas, mas não lhe ponho culpa pelo simbólico mês de junho. Só espero, na segunda quinzena, não me esquecer de seu aniversário, no dia da chegada do inverno, pois junho já se tornou frio e estrepitante.
Ah, eu jamais esqueceria das datas importantes, no entanto... Dia do Nada a Ver, Dia do Fim do Túnel, Dia do Começo ao Fim, e há tantos dias, sempre para se dizer algo sobre alguma coisa, que se não for a minha agenda do ano passado, vez ou outra folheada, haverá pessoas e a TV para lembrar que eles significam algo mais ou nada, mesmo. Assim, eu nunca esqueceria que estou no último mês da metade deste ano, mesmo que eu não saiba o que isso quer dizer-me. É sempre dia de alguma coisa, "while my eyes go looking for flying saucers in the sky."
Desculpem-me, mais uma vez, os solistas, mas eu prefiro os duetos.

12 de junho de 2010

Os ataques dos discípulos do Imperador Cláudio II


A quantidade de pessoas que eu vi questionando a relevância da data em que é celebrado, comercialmente, o dia dos namorados foi espantosa. Eu li frases de muita ironia, destrato, contestações, deboches... então me perguntei: por que será que essas pessoas julgam irrelevante um dia de celebração, como esse, e se preocupam tanto em deixar marcado seu comentário de desdém?
Tirando por mim, que não tenho nada o que comemorar, porque nunca estive, em um namoro, sempre que se passa por esta data (não porque quero, que fique claro!), há, realmente, uma insignificância, mas em tantos anos, quando não me queixo, este dia passa desapercebido: é preto ou é branco, ou é indiferente ou é lastimável.
Posso exemplificar que, singularmente este ano, é um pouco inútil não ter o que comemorar, quando minha vontade é, de fato, que eu pudesse brindar pelo dia de hoje e pelos dias que pudessem fazer parte de 'nossa' história. No entanto, estar solteiro – mesmo que não seja algo lamentavelmente absurdo – é, de certa forma, um vazio (dentre outros) que posso congregar. Porém, não quero me unir aos críticos desta data.
A coisa mais engraçada que acho nos solteiros xiitas que, pela web, eu pude conferir, foi o fato de grande parte deles se incomodar com um dia em que qualquer casal que se ama pode celebrar o momento em que o mercado do consumismo dedica decoração, ofertas, jingles, etc, aos unidos. Sentir-se excluso(a), mesmo que seja de algo superficial e mercenário, deve ser um incômodo muito grande a quem só participa de celebrações nos outros dias do ano, consumindo a liberdade mercadológica de comprar refeição para um, uma camiseta para si mesmo(a) ou qualquer outra inutilidade, como quem se autopresenteia.
Valho-me do ditado velho e oportuno para os solteiros radicais, que estão atacando mais uma data, para eles(as), infeliz: “quem desdenha quer comprar”. Então, que se compre um ingresso, apenas, para o cinema, um mesa monoparental no restaurante ou, no máximo, um par de ingressos para algum concerto dedicado aos exaltados de hoje. A pena é que, extrapolando, você terá uma companhia, mas não há muito o que comemorar com essa, afinal, você continua solteiro(a) e o comércio, por hoje, não precisa de você.
Aos casais que estão alegres, desejo um sábado onde se expresse mais do que os cartões de mensagens prontas fazem, que presentes valham mais do que o significado monetário e que, se for para comemorar de verdade um sentimento, que seja feito à maneira de cada um! Feliz Dia dos Namorados! E que a mensagem de São Valentim esteja dentro do espírito dos indivíduos!

Imagem capturada de: http://www.mworx.at/

9 de junho de 2010

Nada a ver


Uma vez soube que - não lembro quem me disse - a paixão durava três meses. Caso evoluísse, passaria daquele fervor apaixonante para um status mais sóbrio. Eu deduzo, hoje, que a coisa há de ser contínua, sem intervalos, seguindo a normalidade (nem sei se existe neste caso) dos dias de paixão até o sentimento em solidez e sobriedade, após quase noventa dias.
Nesta fase, imagino, posso até compartilhar a experiência que tive, toda reação irracional é deliberada, em hormônios - não se pode esquecer o que é orgânico - a partir de choques psicológicos daquele calor, daquele frio, daquele calor intenso, aquele frio na barriga... Tudo vai oscilando e o corpo responde da forma mais diversa, até quando chega à boca, às mãos, e se exterioriza. Pronto, aí que está um grande desafio!
Exteriorizar de forma intensa, pode causar danos irreversíveis. Quem se preocupa com eles, nos atos do tempo 'durante'?
Existe um julgamento absurdo dessas demonstrações 'públicas' que a paixão nos incumbe fazer que, mediante à coisa exteriorizada, 'a ficha cai' e a preocupação é óbvia: seus amigos, sua família, o leitor do seu blog, etc., muita gente pode perceber que você está apaixonado(a) e aí começam os contrapontos, até o ponto que a pessoa por quem você se apaixona (e você, obviamente) estão expostos(as) à racionalidade medíocre dos não-apaixonados. Então, surgem os diversos adjetivos, muitos deles sequer têm relação com o que você considera nobre ou mesmo não tem considerações racionais.
Relaxe, deixe passar os três meses e verá.
Por que o significado e a razão das coisas ficam, em nós, imbuídas, por todas as ocasiões dessa passagem breve, até na parcela circunstancial de três meses, apenas? Não sei. Sei que permanece em mim, e me machuca muito.
Para mim, os últimos três meses foram de solidão absoluta, neste quesito de paixão. Não havia nada que trouxesse aquele contraste de frio/calor, medo/coragem, etc. Nada me surgiu para que eu pudesse ter uma preocupação banal ou pôr tudo a perder, por não me preocupar com nada que a exterioridade julgasse.
No entanto, o trimestre anterior à fase do sigilo urgentíssimo, diante da falta de boa taquicardia e inexistência da capacidade de me apaixonar foi derrota, a partir do momento que eu comecei a me preocupar com os três meses, aqueles onde eu poderia me libertar da racionalidade e me entregar totalmente à isenção de projetos a dois. Neguei-me o prazer de dar bom dia, todo dia, porque tinha medo de ser julgado como... ah, sei lá! Neguei-me o prazer de mandar mais de um SMS diário só para dizer que o pensamento estava dominado, permanente em... Na verdade, é improvável que essas atitudes fossem diferentes, porque eu estou a todo tempo com uma mordaça, para usá-la, quando os sintomas da paixão começassem a liberar vontade de sorrir com a voz, só por acordar pensando em quem não sai um minuto do pensamento: isso é uma sabotagem das maiores. É loucura maior do que a loucura que a paixão nos causa por meses consecutivos (aqueles três que me disseram, outra vez).
O pior de tudo, os três meses iniciais passaram, eu não aproveite sem a prudência, não deixei que a poesia piegas transitasse, livremente. Amordacei-me. Pensei quinhentas vezes antes de falar uma simples frase ao telefone. Joguei água fria quando me corpo se sentia em brasas. Foi uma grande besteira.
O tempo, senhor da razão que não foi necessária naquela época, ironicamente, parece dar-me outra chance para o mesmo caso, como quem permite consertar meu erro.
Agora, além da mordaça, a qual é preciso arrancar da minha boca, há uma algema desumana a prender minhas mãos. Então, hoje, só meus olhos estão possibilitados de tamanha isenção - de segunda vez.
Pena que meus olhos estão pouco longe de quem quero ver.

Imagem adaptada: Banco de Olhos do Amazonas

7 de junho de 2010

Naquele frio...

Foi o presente mais lindo
Que, aos poucos se esvaindo,
Iludia,
À medida que o tempo escorria.

E antes que ficassem gravados o toque
E o cheiro, que agora estranhos
À mente acostumada, desmemoriada,
Eu senti e absorvi teus cuidados.

Mas eu não ficarei lembrando.
Ficarei abandonado.
Ficarei acostumado.
Estarei pronto,
Sempre a ponto de tratamento.

Já não há mais sequelas.
O passado é que adoeceu.

Imagem: Montañas Cristales, de Chema Madoz