31 de dezembro de 2017

"Ano passado eu morri, mas este ano eu não morro"

Salve o último dia de nossas vidas! Para que tanto? A rotação continua seguindo a mesma lei há milhões de anos, mas tudo isso é um simbolismo mágico que nos embriaga de forma metódica, com os olhos grudados no ponteiro do relógio. Da minha parte, as mesmas regras, também. A saber:
Sigo o mesmo transtorno obsessivo-compulsivo dos meus números pares, talvez ser par, em mim, tenha um significado mais real por andar neste mundo de mãos dadas com a nuvem de algodão que acreditei na infância. "Por onde for, quero ser seu par", como já se cantava numa música aí. E mesmo que ser ímpar denote a sublimação de algum individualismo genuíno, a solidão ainda continua a fazer um dano que só eu sinto, ainda que algumas pílulas me façam esquecer delas durante certas horas de um dia.
Também tenho o mesmo ritual, que acredito ser minha religião anual, quando saio de casa: ponho a mesma música a tocar no fone de ouvido, por repetidas vezes, digerindo cada palavra de uma poesia cantada que parece, mesmo, ter sido, para mim, feita. Incrivelmente, a mesma que me sacode no caminho ao trabalho, à escola, como impulso ritualístico de sorte, fortuna, mas também, para encarar ritmadamente os percalços do caminho, seja qual for meu trajeto, geralmente sozinho, momento em que a música toma o lugar daquela nuvenzinha para me dar a mão e fazer presença.
Pés cansados, um deles dolorido por um tombo ao fim de novembro, que me rompeu uns ligamentos do tornozelo, que, assim, são alguns dias seguintes a sentir a dor no passo a passo que é outra regra ensinada na vida. Pisar dói. De um jeito ou de outro. Andar mediante a dor ou a ausência dela é este sentido direcionado para cumprir um papel de caminhante, de acompanhante, de filho, de irmão, entre os melhores títulos conquistados com o meu sangue ou meu sorriso, talvez até por minhas palavras ou meu silêncio que só poucos entendem.
Foi um ano difícil, de decisões favoráveis, desde este momento em que a ótica é outra e já consigo ser grato. Mas dias atrás, eram as lágrimas que não me deixavam ver a vida desta forma. Porque parecia que o oposto dela era quem vinha querer dar-me a mão em tantos momentos em que eu buscava qualquer elemento vital, no mundo quimérico que me restava, mas não encontrava a companhia; desaguava em mim o turbilhão de impaciência e visão turva. Se é possível, então, renascer, por simbolismo ou necessidade, quero multiplicar-me nesta vida, só uma, na companhia espontânea de quem acompanha atentamente cada passo meu e não mede seus passos para fazer-se par, quer para uma dança, quer para sentar num canto qualquer à exaustão. Aos presentes, o futuro nos reserva sempre, além de datas, desafios para entender a vida é um fluxo contínuo. Quem sabe haja filtros, e quem sabe o que seja naturalmente puro torne cada ano mais um, e único.

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