24 de novembro de 2010

O dia em que a terra parou

Fomos prudentes desde o começo do mundo. Olhamo-nos discretamente para não acordar os dragões que nos devorariam entre os risos nobres dos bêbados. Quanto fogo sairia daquelas bocas e incineraria pretensões, por descuido! - pensei, no outro dia reflexivo.
Águas corriam, ruidosas, enquanto meu relógio apressava a tomar alguma atitude, antes que o tempo fosse inimigo da minha tímida solução temporária: uma conversa sobre amenidades, uma defesa enraizada e um brinde presunçoso à minha desconversa defensiva.
Entre goles excessivos da graça, eu fui me enquadrando, cada minuto a mais, na homogeneidade festiva. Brindávamos à vida e às coisas fúteis que nos distraem porque são necessárias, ante à correria por um espaço fora do útero social. Cada minuto, também, martelava a sentença - veredicto de derrota - de uma nova memória de pele. Essas histórias sempre me fascinaram, ainda mais quando o protagonismo me arrasta para seu elenco.
Nesses enlaces sociais, as aparências contam muito. Quem avalia à primeira vista repara bem no que você informa, através de seus gestos, de seu apego e de seus acessórios. Não há intuito infalível, ainda que você queira agradar. O agrado é outra maneira cordial de se fazer marcado e ganhar destaque quando a unidade pinta apenas monocromias. No entanto, mais importante é, entre croquis de romance entrelinhado, sê-lo tal qual risco íntegro.
A loucura está bem próxima da embriaguez, tinha certeza disso. É... caí no passo dos goles impávidos, ainda que tremesse em certos momentos. Obviamente, o movimento dos olhos, braços e direção de palavras já tinham mostrado que eu era foco de uma observação incessante. Não habitual me sentir confortável nessas situações avaliadoras: uma palavra torpe, uma opinião insensata, qualquer que seja o semblante... tudo transparece meu estado de distração inacessível. Eu sou refém brando, entrego-me à simpatia de belo sorriso e uma prosa afim.
Acredito, ainda, que haja uma cortina imaginária a fim de não revelar os bastidores... Nada muito além da prudência que não oscilou desde o começo do mundo. Eu já não sabia em que Era alucinada estava, dessas de peneiras que não tapam sol nem escondem os raios de luz da lua, tampouco. Sobretudo, assuntos de quarto, com porta fechada, ficam entre as quatro paredes e os seus personagens. Não há mistérios a anunciar mais algum capítulo sucessor.
Fomos prudentes desde o começo do mundo.
Ele gira. A rotação não transgride o tempo em mais que algumas horas.
Em um dia, apenas, é válida a mão que acolhe a outra e, cúmplices (já dueto), contidas no prazer de, iguais, posarem sobre si mesmas, num movimento embalado pelo desejo...

Em um dia, apenas, é preferível a conversa indireta, sem muita pretensão de ser eterna, mas suceptível a esquecer ponteiros e números...

Em um dia, apenas, é instável meu anseio por querer outros dias semelhantes...
Assunto, creio, não faltaria para outros capítulos, nem preocupação com o tempo.
Fomos prudentes desde o começo do mundo e sabemos que ele ainda está condenado às suas rotação e translação.
Nada me convence mais do que minhas próprias convicções, porém estou, sempre, aberto a novos questionamentos, desses à Raul, que intriga sobre qual foi o dia em que a terra parou?

Imagem:
Earth from space with shadow (capturada)

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