15 de maio de 2009

Que dom tem de me fazer bem

A vida é muito interessante. Seria muito pedir-lhe a felicidade plena. Isto é a meta de muita gente que faz seus projetos, como etapas gradativas do apogeu prognosticado. Não é minha pretensão, há muito tempo eu sei que não.

Quero a felicidade simples, aquela que se intercala entre momentos mais diversos. Sem grandes excitações, nem tempestade de sorrisos. Eu cansaria meus músculos da face, traria mais marcas de expressão - não é tanta vaidade assim - mas que isso não é completude, apreendi.

A totalidade conflui de várias arestas e o meu plano não é único: não se resume a um só sentimento. Eu quero o gosto de cada sensação, a que antecipe ou tarde, que provoque inspirações, derrame-se ao transpirar, que não, necessariamente, venha precaver-me dos sintomas, mas que possibilite sempre a cura.

Eu quero a dor, para aprender a suportar a perda, igualmente como quero a analgesia, para sarar os vícios cortantes e restaurar vitalidade. Eu gosto de cada lágrima que derramei, mas eu detesto o sofrimento contínuo. O ato de enxugar o pranto é mais virtuoso do que o desespero de rir de tudo.

Eu amo minha mãe - o único amor exato. Das outras pessoas basta apenas que eu goste, mas não anulo a possibilidade de amá-las. Eu não odeio ninguém, mas não anulo a possibilidade de elas me odiarem. Eu não sou vítima de nada, nem do ódio alheio. Ódio é para os fracos e estes, há um bom tempo, são fadados à derrota pelo sentimento que só lhes trará agonia. Eu não quero a lástima, porque eu fujo do meu egoísmo.

Eu tenho uma grande paixão, ela me faz rever conceitos. Ela me fez chorar de medo. Ela me fez rir de gôzo momentâneo. As paixões ardem, causam a inquietude de que preciso para não cansar meus dedos escritores, meus olhos que leem e o resto de meus sensores. Eu vislumbro o dia em que essa paixão mude, seja melhor ainda, que se aproxime um pouco do que sinto pela minha mãe. Ou que ela parta, por sua própria vontade, completando seu ciclo.

Como disse, não quero a felicidade plena. Bem, pra mim, não é esforçar-se tanto: é dom nato, apenas lapidado, como quem brinca de ourives e não precisa de muita sofisticação, porque jóia nasce preciosa. A arte já é outro valor...

Quero apenas o que dom tem de fazer bem. Quanto ao resto, eu me esforço.

Foto:Estrada de Coruripe (Litoral Sul de Alagoas), por Oliver Saldanha

Um comentário:

  1. Gotei muito da forma como descreve as coisas em seus textos, parabéns, tens um blog muito atrativo.

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